sábado, 30 de maio de 2009

AS NOSSAS RESPOSTAS AO «PÚBLICO»: DECLARAÇÕES DE FÁTIMA GOMES

- O surgimento e acção dos movimentos independentes de professores mudou a luta dos professores ? Porquê? Como? Ou os sindicatos "venceram"?

Não se deverá colocar a questão no domínio de uma luta entre movimentos independentes e sindicatos. A “luta” é comum e é contra as medidas do Ministério da Educação, não só no que respeita a avaliação de desempenho, mas, muito especialmente, no que toca o próprio conceito que preside à dita “reforma educativa”. Enquanto agentes desta reforma, sabemos, melhor que ninguém, o quanto esta “reforma” põe em causa todo o sistema de ensino público e compromete uma reforma real que tenha em vista a melhoria da qualidade da escola pública. Contudo, é inegável que o surgimento dos Movimentos mudou completamente o quadro de acção da luta de professores. Aliás, é um fenómeno único relativamente a qualquer classe profissional: os professores foram capazes de se organizar, movidos por um genuíno sentimento de contestação dos princípios e de revolta face ao desprezo como estavam publicamente a ser tratados, transcendendo as organizações tradicionais. Este fenómeno ainda será estudado, já que revela uma alteração de mentalidades e dos modos de actuação, fruto de uma dinâmica que envolve a sociedade, o acesso à informação e a capacidade de comunicar globalmente. Os sindicatos de professores tiveram de lidar com o exercício de opinião dos professores, directamente, e este é um fenómeno que, a breve prazo, se estenderá aos próprios partidos políticos. Os sindicatos não “venceram”, e para já, também não “perderam”, os sindicatos tiveram de se adaptar a uma situação inteiramente nova… e ainda o estão a procurar fazer.

- Esperava que a ruptura pudesse ter sido maior? (Ruptura em tipos e métodos de acção).

Esperava, sim, e creio que existiram condições para essa ruptura. A plataforma sindical, em conjunto com a esmagadora maioria dos professores, conseguiu feitos inéditos na história recente – realizaram-se duas manifestações com números assombrosos para uma única classe profissional. O mesmo aconteceu com os números das greves, apenas ”ignorados” pelo governo, pois em todo o país foi visível o grau dessa participação. Os professores estavam mobilizados, unidos, orgulhosos pela defesa da dignidade da classe e cientes de que lutavam por algo mais do que meras razões profissionais. Em Dezembro, início de Janeiro, estavam criadas as condições para que a plataforma sindical desse o golpe final. Não o fez. A meu ver, foi um erro crasso. Não poderei avaliar completamente, sem incorrer no perigo de ser injusta e irresponsável, quais as razões que fizeram os sindicatos, se não recuar, marcar passo. Julgo que, mais uma vez, se trata da incapacidade destes sindicatos (como aconteceria com outros) de lidar com uma força com a qual não estavam habituados, nem preparados, para lidar. Estas estruturas não têm a flexibilidade necessária para gerir uma situação destas, estão presas a tiques que vêm de longe. É precisamente essa flexibilidade que têm os Movimentos, por não estarem ligados a qualquer disciplina, nem política nem ideológica. Os Movimentos, constituídos por professores no activo das funções, sabiam exactamente qual era o sentir da classe, pois é o seu próprio sentir e a própria razão da sua existência. Na verdade, os sindicatos caíram no mesmo erro que, um dia, presidiu à assinatura do famigerado “memorando de entendimento”, e que lhes valeu uma grande contestação dos professores, que procuraram redimir na manifestação de 8 de Novembro – uma via negocial enviesada, quando é já manifesta a incapacidade desta equipa ministerial de negociar e ouvir, tanto os parceiros institucionais, como aqueles que tão incisivamente, e em massa, manifestaram a sua oposição.

- Quando iniciaram as movimentações, contava chegar ao fim do ano lectivo nesta situação no que respeita tanto à avaliação, como ao ECD?

De facto, não contava. Com a imensa força que se gerou, com a contestação massiva, nunca previ que, nesta altura, não tivesse sido já dado o “murro na mesa”. Contudo, é importante frisar que, não tendo nada de substancial mudado, também nada se aplicou. Estamos a atravessar uma “terra de ninguém” em que reina o faz de conta. A ministra, o primeiro-ministro, os secretários de estado, todos sorriem, querendo fazer crer que tudo funciona. Nas escolas, na esmagadora maioria das escolas, os professores cumprem as suas funções, aquelas que verdadeiramente os preocupa e interessam para a escola: dão as aulas, desenvolvem actividades que consideram pedagogicamente produtivas e relevantes para os seus alunos. Deste modelo de avaliação, resta um cadáver informe. Estamos à espera do enterro, apenas.

- Entregou os OI? Na sua escola foram mais professores que entregaram ou o inverso?

Não entreguei. Na minha escola, metade fê-lo e a maior parte foram os professores contratados, por estarem numa situação extremamente precária.

- Como está o ambiente na sua escola? Os professores estão divididos, há mal-estar, por causa das posições adoptadas quanto à avaliação?

No início ainda houve alguma crispação, tanto dos colegas que se sentiam traídos porque este ou aquele colega que entregava os objectivos, quer pelos próprios professores que os entregavam, sentindo-se pressionados (pela precariedade da sua colocação, pelo medo dos concursos) a fazer algo que, no fundo, contestavam. Contudo, deve ressalvar-se que a grande maioria dos professores que entregou os objectivos não pediu observação de aulas, não porque temam esta observação, como é óbvio (o nosso desempenho é diariamente observado), mas porque não quiseram tirar proveito das quotas para classificações de Muito Bom e Excelente, quando outros colegas mantinham o sentido da luta.

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