A APEDE, Associação de Professores e Educadores em Defesa do Ensino, vai realizar uma reunião aberta a todos os interessados no próximo dia 11 de Outubro, nas Caldas da Rainha, em local e hora ainda a anunciar. Queremos debater, com quem esteja disposto a acompanhar-nos, o futuro do movimento e da luta dos professores.
O ano lectivo que teve agora início vai ser, ao mesmo tempo, extremamente difícil e absolutamente decisivo. Difícil porque nós, professores, partimos agora numa posição de desvantagem maior do que aquela em que nos encontrávamos no final de 2007. O movimento de revolta que irrompeu a partir de Fevereiro de 2008, e que tão rapidamente culminou na maior manifestação de sempre de uma única classe socioprofissional, suscitou uma enorme expectativa. Os mais optimistas – mas talvez também os menos lúcidos – pensaram então que a demissão desta equipa ministerial estaria já ao virar da esquina. Por isso, foi tão grande a ressaca quando se descobriu as mãos cheias de nada que nos deixou o acordo assinado pelos sindicatos com o Ministério da Educação. Por isso, os professores estão ainda hoje a remoer os restos da desilusão, do sentimento de frustração e de impotência que parecem ser o saldo de todo um ano de mobilizações, de protestos e de contestação activa.
Perante uma aparente resignação generalizada, as escolas preparam-se para aplicar, neste ano lectivo, todo o pacote legislativo contra o qual lutámos meses atrás: uma avaliação do desempenho delirante, hiperburocratizada e absurda, imposta apenas como um acto de teimosia destinado a vergar os professores, a par de um novo modelo de administração escolar apostado em asfixiar os parcos resíduos de democracia que ainda sobravam dentro da escola pública. Hoje, uma parte significativa dos nossos colegas parece rendida às “estratégias de sobrevivência”: uns optam por tentar adaptar-se aos ditames ministeriais, outros acotovelam-se para obter um “lugar ao sol” nas novas hierarquias que já se perfilam, e a maioria procura simplesmente manter a sanidade mental que lhe permita dedicar-se à sua função primeira – a de educadores e transmissores de saber – no meio de uma sobrecarga de trabalho imenso e esgotante, concebida para nos alienar e nos furtar à distância reflexiva sem a qual é impossível exercer a crítica. E, no entanto…
… E, no entanto, algo começa a pulsar por debaixo da nossa frustração colectiva. O profundo mal-estar que se vive nas escolas volta a estar na ordem do dia, alguns (ainda poucos) órgãos de comunicação social principiam a dar sinais da revolta surda que também agita muitos docentes, o marasmo exibe as primeiras brechas. Pensamos, pois, que é chegada a altura de relançar o movimento. Somos, afinal, uma Associação legalmente constituída e continuamos a pugnar pela unidade e pela representação de todos os professores que entendam juntar-se a nós para derrubar esta equipa ministerial e as suas políticas.
Não tenhamos ilusões. ESTE ANO LECTIVO VAI SER UM ANO-CHARNEIRA. Se, até Junho-Julho de 2009, não conseguirmos inverter as políticas do Ministério da Educação e minar os seus principais pilares – o Estatuto da Carreira Docente, o modelo de avaliação de desempenho e o modelo de gestão escolar –, Maria de Lurdes Rodrigues e José Sócrates poderão cantar vitória e exibir as suas políticas do ensino como uma bandeira para efeitos de campanha eleitoral. E, SE ISSO ACONTECER, TAIS POLÍTICAS TER-SE-ÃO INSTALADO IRREVERSIVELMENTE NO SISTEMA EDUCATIVO DESTE PAÍS. E não se pense, como alguns querem dar a entender, que uma mudança de ciclo eleitoral irá alterar alguma coisa de substancial na escola pública portuguesa. Os actuais decretos que merecem a contestação dos professores moldarão a face deste sistema por muitos e longos anos. E o ensino em Portugal ficará desfigurado até nada restar senão uma caricatura grotesca: professores-amanuenses, vergados e amordaçados pela bufaria e pelo clima pidesco que se está a instalar em muitas escolas, todos domesticados para fabricar em série um “sucesso escolar” puramente artificial. Confrontamo-nos, por isso, com uma grande exigência: EM 2008-2009, TEREMOS A ÚLTIMA OPORTUNIDADE PARA LUTAR CONTRA UMA PERSPECTIVA DE FUTURO TÃO SOMBRIA.
Os desafios que nos esperam são múltiplos, dada a pluralidade dos constrangimentos que nos afectam:
• Devemos lutar pela restauração de um horário laboral condigno e compatível com o rigor do trabalho pedagógico. Muitos dos professores são hoje obrigados a passar 40 e, por vezes, mesmo 50 horas por semana nas escolas, quase sempre com incumbências burocráticas ou pseudo-reuniões de trabalho que nada acrescentam à natureza da sua profissão e ao tempo indispensável para a preparação das aulas e para o acompanhamento dos alunos. Temos, assim, de denunciar esta situação junto dos órgãos de comunicação, recolhendo para isso exemplos que a possam ilustrar. Paralelamente, urge lançar nas escolas uma campanha subordinada ao lema “nem mais um minuto para além das 35 horas”.
• Devemos denunciar todos os abusos de autoridade praticados pelos órgãos executivos de certas escolas e resistir contra o exercício do poder em moldes que começam já a revelar-se fascizantes. De facto, em determinados estabelecimentos de ensino está a desenvolver-se um clima intimidatório e persecutório que é totalmente incompatível com o exercício da liberdade de expressão e com a luta pelos direitos laborais. Isto prolonga o atavismo português que cultiva o gosto pelo autoritarismo, confirmando a persistência da mentalidade salazarista que teima em enraizar-se na nossa sociedade. Temos de contrariar semelhante tendência, recolhendo igualmente todos os exemplos com que a mesma se apresenta nas escolas e denunciando-a o mais amplamente possível. Mas, sobretudo, temos de a combater de forma activa, recusando todo e qualquer autoritarismo arbitrário, venha ele de onde vier.
• Devemos denunciar, junto das associações de encarregados de educação e dos órgãos de comunicação social, a forma insidiosa com que o Ministério pretende, através do novo Estatuto do Aluno e do próprio modelo de avaliação dos professores, fabricar um “sucesso escolar” meramente estatístico, sem qualquer correspondência nos conhecimentos efectivamente adquiridos pelos alunos, com isso hipotecando as qualificações reais das gerações futuras de trabalhadores portugueses. A este respeito, é também fundamental desmontar a enorme fraude subjacente às “Novas Oportunidades” e aos famigerados Cursos de Educação e Formação de Adultos.
• Precisamos de retomar a ideia de construir e propor alternativas credíveis às políticas ministeriais, sem o que continuaremos a ser percepcionados como uma classe corporativa que só se empenha em contestar, mas que nada tem para oferecer de positivo.
Algumas destas propostas poderão ser concretizadas através da iniciativa das cartas enviadas aos órgãos de comunicação e a várias instâncias de soberania (Ministério da Educação, Assembleia da República, Presidente da República, Provedor de Justiça, etc.), uma ideia que, embora integrasse o nosso programa de acção, permanece por realizar.
Para que estas e outras sugestões possam ganhar corpo, para que a APEDE volte a ser uma plataforma de mobilização dos professores, apelamos a que todos compareçam e participem na reunião de 11 de Outubro. Lembramos que, SE NÃO FORMOS NÓS A LUTAR, NINGUÉM O FARÁ EM NOSSO LUGAR.
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