A avaliação do desempenho docente não deve basear-se, prioritária ou exclusivamente, na avaliação entre pares.
Ao invés dos que pensam que só a avaliação entre pares assegura o rigor do processo avaliativo, e que aquela constitui, em si mesma, uma situação pacífica, consideramos que a relação entre avaliadores e avaliados, num processo como este, suscita dificuldades estruturais que deveriam aconselhar a maior prudência. Antes de mais, convém lembrar que toda a relação avaliativa é uma relação de poder, assentando numa hierarquia passível de ser legitimada. Sucede que, no caso da avaliação entre professores, uma tal relação está, por natureza, fragilizada na medida em que é eminentemente contestável. De facto, os professores obtiveram a sua formação científica e pedagógica para avaliar alunos com os quais mantêm uma relação que é, para todos os efeitos, essencialmente assimétrica: pressupõe-se que os alunos não dispõem do capital de conhecimentos e de competências que os seus avaliadores possuem, e é nessa distância ou nesse desnível que se joga a sua avaliação. Mais: essa assimetria é a condição mesma para que uma avaliação possa decorrer. Ora, a avaliação dos professores irá dar-se numa situação relacional diametralmente oposta: os professores estarão a avaliar os seus pares, com os quais se supõe manterem uma relação de simetria em matéria de competências científicas e pedagógicas. A delicadeza desta simples situação é de molde a criar os maiores problemas, pois ela põe em causa a própria autoridade do avaliador face ao avaliado. A isto acrescem as dificuldades próprias do contexto relacional intrínseco aos diferentes departamentos. Avaliadores e avaliados, muitos deles com um historial de convivência já longo, estão ligados por relações afectivas que podem ser de amizade, de cumplicidade, mas também de rivalidade, de tensão e de conflito, se não mesmo de hostilidade. Afigura-se como praticamente impossível que estas modalidades de relacionamento não venham a produzir ruídos e interferências mais ou menos incontroláveis, abrindo a velha e incontornável questão da subjectividade na avaliação.
2 comentários:
Se os pares são competentes, mas não isentos; e se os avaliadores exteriores são isentos, mas não competentes - o que é que resta da possibilidade de avaliar eficazmente? A Ordem dos Professores é cada vez mais necessária.
José Luiz,
Reconheço que aqui existe, de facto, uma aparente quadratura do círculo, aquela maldita situação a que os filósofos chamam «aporia», para a qual nunca há uma solução óptima. É por essas e por outras que todo este processo da avaliação dos professores tem sido conduzido com um misto de arrogância, de precipitação e de incapacidade de colocar sequer os problemas pertinentes. Parte-se de uma pseudo-solução - a de uma certa ideologia pedagógica - que pretende funcionar como rolo compressor para as dificuldades que, no terreno, continuam a existir.
Julgo que, antes de se avançar com estrépito para a avaliação dos professores, se devia ter começado por responder a uma questão prévia, sem a qual não faz sentido equacionar a dita avaliação: que sistema educativo queremos e com que objectivos? Quando formos capazes de responder, de maneira inteligente, a esta pergunta, então poderemos conceber uma avaliação dos docentes que se adeque à escola necessária para este país. Se, entretanto, continuarmos mergulhados na imensa farsa em que se transformou o ensino em Portugal, então já estou como diz o Vasco Pulido Valente: avaliar os professores para quê?
Enviar um comentário